1.05.2009

APENDICITE

Desafio os não preguiçosos a descobrir a definição de apêndice. Ah, e já que estão numa de levantar o rabo procurem também a definição de design. "Espera lá! Apêndice? Design?"

Como eu também sou preguiçoso, e o dicionário é de todos os clássicos o que mais desprezo, gosto de inventar as minhas próprias definições, significados e aplicações das palavras. Assim posso dizer que a política é um apêndice, por exemplo, ou que o socialismo de Marx tem um design interesante. E quem me pode corrigir? Ou melhor, quem se dá ao trabalho? Adiante.

Diz-se que a invenção surge aquando da necessidade. Não necessariamente (trocadilho de merda). Na sociedade presente há muita coisa que usamos não por necessidade, mas por culto ao apêndice. Os nossos carros, os nossos telemóveis, os nossos portáteis, as nossas mochilas, as nossas roupas, as nossas casas. Tudo aquilo que antes surgia para desempenhar uma função específica e importante, fundamental e acima de tudo de maneira funcional através da forma funcional (são coisas diferentes), serve agora como símbolo do nosso indivíduo, da nossa diferençiação em relação aos outros, de elemento que nos distingue e que reflecte "o nosso estilo pessoal", quando no fundo o que fazemos é copiar o estilo de algum ou alguma modelo que vemos nos anúncios de revistas e televisão. Desejamos a mesma roupa, os mesmos telemóveis, os mesmos carros, queremos todos o mesmo, na desesperada e ilusão de que seja esse item que só nós teremos e mais ninguém poderá ter que nos irá distinguir dos outros, elevar-nos à condição de único e inagualável. Assim, para mim, nada distingue o primeiro classificado da prova dos 100 metros do último classificado, que chegou 4 segundos atrás. Ambos correram pelo mesmo. Vejamos se me contradigo mais à frente.

Quase tudo o que possuímos, e absolutamente tudo o que desejamos são apêndices. Extensões de nós próprios e das nossas pretensas identidades, sejam elas quais forem. Se uma invenção, como o automóvel ou o telemóvel fossem apenas isso, um veículo eficaz de transporte, um aparelho de comunicação sem fios, essas invenções não teriam sobrevivido muito tempo. Depois do essencial estar minimamente satisfeito, como a necessidade de deslocação rápida e da comunicação remota, os responsáveis pela comercialização de tais aparelhos necessitam de inverter a função dessas invenções, para que a demanda destas aumente e continua a existir. Um carro já não é um veículo de transporte, mas um símbolo de virilidade, posição social e estilo. Os nossos telemóveis passaram a ser câmaras de fotografar e filmar, consolas de jogos, browsers de internet, pocket PC's, um aglomerado de funções que não funcionam. Já não queremos nada que traga e faça apenas aquilo que precisamos que faça a um preço proporcional. Deslocarmo-nos cómoda e rapidamente a baixo consumo enérgico, receber e efectuar chamadas, receber e mandar mensagens de texto, não é isso de todo o que procuramos num carro ou num telemóvel. Mas era para isso que eles serviam, foi para essa função que foram criados, desenhados.

O que me leva ao design (aproveito a proximidade das palavras, e das palavras apenas). Design não é desenho. Resposta errada, abre-se o alçapão para o poço da ignorância, adeus sua besta, que caias de fuça! Design não é estética. Design é ética. É conceber a melhor solução funcional, desde o processo de produção ao da distribuição, uso e manutenção. Fazer algo com benefício de toda a humanidade em mente.  Nada mais. E isso aplica-se a tudo. Os carros de hoje não são funcionais. Não são práticos, não são económicos, não são duráveis, não são eficazes, não são ecológicos, não são recicláveis, não são automóveis. O mesmo para os telemóveis. Mas isto são só exemplos. A política tem um mau design, não funciona, não desempenha a função a que se propõe, não resolve problemas, e não é ética (ética não é aquilo que se aprende na universidade). Resumindo, aquilo que tu tanto admiras pelo seu "fantástico" design é totalmente desprovido do mesmo e, por consequência, tudo menos fantástico. O que é fantástico é a capacidade do ser humano de chapinhar no esterco e de regozijar enquanto o faz.

No próximo post explicarei porque desisti de ser arquitecto.

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